Segue um modelo de uma caixa-surpresa que eu confeccionei e em seguida um texto que sugere várias formas de se trabalhar com ela. Muito rico. Espero que gostem!
ATRAVÉS DO LÚDICO, A CRIANÇA REALIZA UMA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
Nas classes de educação infantil, quanto maiores forem as oportunidades de trabalhos, de descobertas, manipulações, construções que o professor oferecer às crianças, maiores serão as suas chances de um desenvolvimento harmonioso e compatível com suas possibilidades.
Especialmente aquelas atividades que envolvem o lúdico são desencadeadoras de uma aprendizagem prazerosa e significativa.
A partir da idéia de que o trabalho docente deve ter como objetivo o favorecimento de práticas interdisciplinares, dentro de uma proposta construtivista e sócio-interacionista, o professor deve buscar um modo criativo e direto de atuar, oferecendo às crianças inúmeros jogos, brincadeiras, atividades diversas de culinária, de laboratório e de construções variadas em sala de aula, o que pode vir a melhorar, com certeza, a qualidade do ensino e da aprendizagem.
A atividade que ora apresentamos pretende ser uma sugestão, criada e realizada pelo grupo Interdisciplinaridade Lúdica e que pode proporcionar o desenvolvimento e enriquecimento de qualquer tema ou assunto a ser abordado em sala de aula. Pode ser também, em todas as áreas de conhecimento e provocar o envolvimento do grupo familiar no aprendizado da criança.
Essa atividade tem como objetivos:
• Favorecer a aquisição de habilidades que permitam à criança analisar de forma crítica o mundo que a cerca, enfrentando novos problemas e convivendo com os outros de forma cooperativa, como cidadã afetiva e curiosa;
• Atender necessidades psicossociais, propiciando condições de ampliação de suas experiências, partindo sempre das suas próprias vivências e condições concretas do dia-a-dia;
• Socializar, oportunizando a participação e a espontaneidade, proporcionando seu pleno desenvolvimento e considerando a expressão oral e escrita de cada um, o respeito do grupo como um todo, incluindo os seus familiares;
• Desenvolver e explorar, de forma interdisciplinar, todas as áreas do conhecimento numa mesma atividade, diariamente;
• Favorecer o intercâmbio de idéias, informações, hipóteses, deduções, verbalização, regras e conceitos, como ordem temporal, forma geométrica, peso, cor, tamanho, uso e função, som, odor, classificação, seriação, pertinência, número, sílaba, origem da matéria, sequência, letras, entre outros;
• Ampliar o vocabulário, desenvolver a linguagem, sob o foco descritivo e narrativo;
• Incentivar a curiosidade, o entusiasmo, a imaginação, a representação (gráfica, mímica, pictórica, sonora, dramática).
Para realizar a atividade, é preciso que o professor fabrique a caixa-surpresa, juntamente com as crianças. Ela é uma caixa de papelão, de tamanho regular, onde possam caber objetos de vários tamanhos, devidamente encapada e decorada conforme o desejo das crianças.
A cada dia, uma criança leva a caixa para casa e a traz no dia seguinte, mas que atenda ao estabelecido pelo grupo de alunos. Pode ser, por exemplo, um objeto cujo nome inicie com a letra trabalhada na semana ou a letra do seu nome ou um objeto relacionado ao assunto trabalhado ou de livre escolha da criança. A brincadeira consiste em o grupo adivinhar o que está dentro da caixa.
Para envolver a família e num incentivo à responsabilidade e à criatividade do aluno, o professor coloca dentro da caixa algumas instruções que devem ser atendidas, o objetivo a que se destina, o observações que forem necessárias. (Ver o quadro Instruções.)
INSTRUÇÕES
1. A criança deve escolher qualquer objeto (brinquedo, vestuário, utensílio doméstico etc.) e colocá-lo dentro da caixa. Apenas um objeto.
2. Na classe, ela terá de dar dicas para que os colegas descubram o que há dentro da caixa. Por isso, é aconselhável que os familiares conversem bastante com ela, explorando o material.
3. No cartão que há no interior da caixa, a família deve escrever o nome do objeto, em letra de forma ou de imprensa.
OBJETIVO:
Oportunizar o desenvolvimento da linguagem verbal e o uso da escrita.
OBSERVAÇÕES:
1. O objeto será devolvido no mesmo dia.
2. É indispensável o cuidado com a caixa.
No desenvolvimento do trabalho, deve haver um rodízio permanente entre as crianças, de acordo com critérios estabelecidos pelo grupo, a fim de proporcionar vez a todos.
A atividade pode ser enriquecida e adaptada conforme as necessidades e as possibilidades dos alunos.
Por exemplo:
Para os alunos maiores (a partir dos quatro anos mais ou menos), após os objetos ser mostrado, pede-se que seja desenhado na lousa e que o nome do objeto seja escrito. Porém, enquanto o aluno ainda não domina a escrita, é importante que traga de casa um cartão com o nome do objeto, escrito em letra de forma, dentro da caixa. Assim as crianças, após a descoberta, podem copiar do cartão o nome do objeto.
Posteriormente, o uso desse cartão vai sendo dispensado, quando os alunos, por tentativa e erro, começam a levantar hipótese para essa escrita. Então, após a descoberta do objeto, a criança que trouxe o desenha na lousa e, com o auxílio dos colegas e do professor, vai escrevendo as formas possíveis do nome do objeto.
Nessa escrita espontânea podem ocorrer erros ortográficos, como nos sons parecidos e correlatos (s/c, j/g, s/z, c/k, x/ch...), que com interferência do professor, de forma sugestiva, vão sendo esclarecidos até que a escrita formal tenha se apresentado na sua correta forma gráfica. Não se trata de corrigir a escrita espontânea que, em muitos momentos diários, em várias outra atividades, é estimulada, mas, sim, de apresentar a possibilidade de se refletir e reconhecer até a necessidade de se recorrer ao dicionário ou a outras pessoas, para que tenhamos preservada a exatidão do que queremos aprender, enquanto grupo, da nossa língua pátria.
Se o objeto não conseguir ser descoberto depois de todas as tentativas e dicas possíveis, pede-se que a criança ou o professor escreva seu nome na lousa e que os colegas, a partir da tentativa de leitura, o descubram.
Várias atividades e situações podem ser desenvolvidas com a palavra escrita na lousa:
_ contagem do número de letras da palavra;
_ reprodução da forma de cada letra com as mãos (mímicas), chegando assim à palavra completa;
_ separação e contagem do número de sílabas (quantas vezes eu abro a minha boca para falar a palavra) e, simultaneamente, marcar a cadência com palmas, pulos, batidas na mesa ou nas pernas etc.;
_ discriminação, com a criança, do valor sonoro individual de cada fonema, o que irá ajudar o aluno na formação de novas hipóteses e, consequentemente novas palavras. As letras dentro de nossa proposta são muito trabalhadas enquanto som e não apenas pelo seu nome formal que, paralelamente, é apresentado;
_ levantar nomes de alunos que comecem com a mesma letra, ou que tenham algumas delas em seu próprio nome;
_ imitar o objeto, dramatizar com ele, onde vive, quem o tem;
_ descobrir palavras que combinem com o seu som final (versos, rimas, música).
A caixa-surpresa é, por excelência, uma atividade interdisciplinar; sua exploração chega a ser ilimitada e nunca se torna monótona. Para exemplificar, apresentamos uma situação ocorrida em sala de aula de pré-escolar, em 1997.
Um dos temas trabalhados em abril foi o Índio Brasileiro, resgatado pelas próprias crianças com pesquisas, coletas de informações, etc. Dentro do tema surgiu a letra U, decorrente do UAÍ (tambor indígena). Na semana dessa letra só valia trazer na caixa-surpresa objeto cujo nome começasse com o U. Num determinado dia, o aluno que trouxe a caixa, sentou-se à frente dos colegas, sacudiu-a e passou a caixa para que todos pudessem sacudi-la também, sabendo-se de antemão que não valia abrir a caixa e que só se podia dizer o que achava que fosse o objeto, depois de várias dicas e com quase total certeza, em coerência a elas. O aluno começou a responder as perguntas que eram formuladas:
_ De que cor é?
_ É grande ou pequeno?
_ Quebra?
_ Qual sua forma?
_ É leve ou pesado?
_ De que material é feito?
_ Tem cheiro?
_ Tem em casa? E na escola tem? E na cidade? E no Brasil?
_ Onde se guarda? Onde fica na casa?
_ Onde é usado? Tem música com esta palavra? Qual?
_ Todo mundo tem?
_ Quem usa? Criança ou adulto? Homem ou mulher?
_ É liso ou áspero?
_ É de comer?
_ É frio ou quente?
_ É duro o mole?
_ Para que serve?
Baseados nas respostas às perguntas formuladas, os colegas puderam descobrir que o objeto era um urso polar macho (últimas dicas: não é do Brasil, porque ele mora lá no Pólo Norte e é menino) e sabia-se que não valia repetir algo que já tivesse sido trazido anteriormente.
Verificamos o resgate final da escrita da palavra urso com a colaboração dos colegas. (Em negrito, fizemos a sinalização da palavra para melhor identificação.)
A partir desse exemplo citado, podemos perceber que uma aparente atividade simples como essa e que, geralmente devido ao grande interesse e motivação do grupo, acaba se estendendo por um período maior do que o previsto atinge de maneira interdisciplinar a todas as áreas de conhecimentos. Didaticamente, poderíamos listar as áreas de conhecimentos e algumas de suas possíveis sub-áreas de abrangência, conforme quadro abaixo.
Em nossas experiências com essa atividade, em vários anos seguidos, temos podido nos divertir com objetos os mais inusitados e interessantes. Por exemplo, só vale partes do corpo ou que se usa no corpo aparecem: dentadura, aparelho ortodôntico, lente de contato, óculos, unhas postiça, cueca, aparelho auditivo...
Em só vale com a letra... (escolhe-se a letra) já encontramos espátula, escumadeira, pegador de gelo, mamadeira, isopor, pinça de sobrancelhas, dedal, quebra-nozes, imã, esponja, fraldas descartáveis, engrenagens, minhocas... Entre outros.
É desse modo que estamos estimulando o crescimento da informação e da cultura geral de todos os envolvidos. Faça esta experiência, vale a pena!
ÁREAS DE CONHECIMENTO
Sub-áreas de abrangência
Conhecimento em linguagem:
• Desenvolvimento verbal, gráfico e pictórico;
• Mímica, imitação, dramatização;
• Reconhecimento das formas de letras (escrita individual do aluno);
• Enriquecimento de vocabulário;
• Levantamento de hipóteses e verbalização;
• Ortografia;
• Som, oralidade (valor sonoro de cada letra e valor sonoro de suas combinações);
• Dedução e lógica;
• Musicalidade, rima, ritmo;
• Coordenação viso-motor;
• Coordenação fina e ampla;
Conhecimento em Lógico-Matemático:
• Memória • Quantidade – valor maior/menor;
• Noções de número;
• Cor;
• Textura;
• Peso
• Forma geométrica;
• Volume;
• Tamanho, comprimento;
• Posição;
• Diferença e igualdade;
• Conjunto;
• Pertinência;
• Custo: caro/barato
Conhecimento Social:
• Desinibição, extroversão, alegria;
• Socialização, cooperação;
• Intercâmbio de informações;
• Respeito à fala e à opinião do colega;
• Crítica positiva ao erro do colega por falta de coerência frente às dicas apresentadas;
• Uso social, utilidade do objeto, função;
• Atenção;
• Concentração;
• Localização geográfica e histórica;
• Envolvimento familiar;
• Expectativa, suspense, curiosidade;
• Localização espacial (em casa, em classe, no ambiente);
• Cultura pessoal e familiar;
• Necessidade de se ter esse objeto - noções de essencial/supérfluo
Conhecimento do Meio Natural:
• Olfato;
• Estados da matéria: sólido, líquido, gasoso;
• Origem: vegetal, animal e mineral;
• Temperatura;
• Matéria-prima e produto industrializado;
• Alimento: origem;
• Paladar;
• Noções de saudável e nocivo para nós;
• Segurança de manuseio: orientação;
• Parte do corpo
FONTE:
• ADRIANA ELIZABETH RISI SIMÕES SIGNORETTI
• KEILA KLINKE MONTEIRO
• LOBÉLIA MARIA D. DE OLIVEIRA DIAS
• ROSEMARY A. CUNHA DAÓLIO
• SILVANA DE FREITAS LÉSSIO
Professoras da Escola Municipal de Educação Infantil “Professor Hilário Pereira Magro Jr.” Campinas/SP
(Revista do professor, Porto Alegre, 14 (54): 5-7 abr./jun. 1998)
1 comentários:
Essa caixa surpresa ficou o máximo e esse texto é riquíssimo Andréa, gostei muuuuito!
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